Posição da Sociedade Brasileira de Dermatologia acerca da matéria publicada
na revista Veja (Edição 2.304) de 16 de janeiro de 2013, denominada: Um Lugar
ao sol para a vitamina.
O debate, dentro do meio científico, acerca dos benefícios relacionados à
Vitamina D e a exposição ao Sol não é recente, e é motivo de diferentes
publicações na literatura.
O tema é controverso e envolve, entre outros fatores, a orientação acerca da
necessidade para a exposição ao sol versus a fotoproteção, medida
frequentemente orientada pelos dermatologistas a seus pacientes, para a
prevenção do câncer de pele, do fotoenvelhecimento e no tratamento de
discromias e outras fotodermatoses.
A Sociedade Brasileira de Dermatologia, entidade que congrega mais de 6000
dermatologistas Brasileiros, sente-se na obrigação de manifestar uma posição
formal, baseada em referências de literatura e em sintonia com outras entidades
representativas internacionais.
A orientação da SBD deve servir também como fonte de informação e orientação
para que seus associados possam se posicionar frente à manifestação de
pacientes, particularmente acerca da necessidade de fotoproteção.
Para a adequada compreensão do posicionamento, entendemos necessária a
manifestação clara de algumas premissas, apresentadas abaixo:
1 – Benefícios da Vitamina D
O único benefício reconhecidamente relacionado à Vitamina D é sua relação
com a saúde óssea, através da participação no metabolismo do cálcio. Níveis
adequados de vitamina D estão relacionados à prevenção do raquitismo e da
osteoporose.
Segundo a posição formal do Instituto Nacional de Medicina dos Estados
Unidos da América (IOM), publicada no ano de 2011 no Journal of Clinical
Endocrinology and Metabolism
1,
“a evidência de que
a vitamina D ou o cálcio reduzem o risco ao desenvolvimento de doença crônica
não–esquelética é
inconsistente, inconclusiva e não atende aos critérios de
relação causa-efeito. Evidências vindas de estudos randomizados são
esparsas”.
2 – Níveis Séricos de Vitamina D3
A definição de Deficiência de Vitamina D, baseada nos níveis séricos de
vitamina D3 também é motivo de controvérsia na literatura: Valores acima de 30
ng / ml ( > 75 nmol / l) são considerados como satisfatórios por todos os
autores. Níveis inferiores a 20 ng / ml (< 50 nmol / l) podem ser
consensualmente considerados como definição de Deficiência de Vitamina D, pois
cobrem a necessidade de mais de 97,5% da população. A controvérsia relaciona-se
aos valores compreendidos entre 20 e 30 ng/ml, onde alguns autores definem uma
situação intermediária, denominada de “Nível Insatisfatório”. A variação do
ponto de corte pode produzir um aumento bastante expressivo no número de
indivíduos classificados como deficientes, conforme são apresentados em algumas
estatísticas mais alarmistas. Dados epidemiológicos mundiais mostram que
somente cerca de 30% dos indivíduos apresentam índices de vitamina D menores
que 20 ng/ml e, portanto, podem ser classificados como deficientes, de forma
consensual
2.
3 – Exposição ao Sol e Vitamina D
A radiação Ultravioleta do tipo B (UVB), com pico de ação em 296nm, atua no
metabolismo da vitamina D, transformando, na epiderme, 7-Dehidrocolesterol em
pré-colecalciferol (pré-Vitamina D3). A partir daí, uma sequencia de reações
metabólicas de hidroxilação vão ocorrer no fígado e nos rins, até a produção da
Vitamina D (1,25-dihidrocolecalciferol).
A dose estimada de UVB necessária para a produção de 1000 UI de Vitamina D é
de 0,25 Doses Eritematosas Mínimas (DEM), em cerca de 25% da área corporal
total. É, portanto uma dose considerada pequena, se comparado à dose necessária
para produção de eritema.
Segundo estudo publicado por De Paula Correa et al
3, avaliando o
nível de radiação na cidade de São Paulo durante um período de 3 anos, a
exposição não intencional ao ambiente externo pelo tempo de 10 minutos diários,
somente das mãos e face, seria suficiente para a produção adequada de Vitamina
D em uma pessoa de Fototipo II. Os dados apresentados pelo estudo já consideram
os dias nublados e chuvosos, portanto, somente 10 minutos de exposição ao
ambiente externo,
qualquer que seja o clima, somente de mãos e face,
seriam suficientes para a produção de vitamina D na cidade de São Paulo. Isso
demonstra que, em um país com altos níveis de insolação, como o Brasil, devemos
ter maior preocupação com os riscos relacionados à exposição solar do que com
os riscos relacionados à sua não-exposição
Em relação ao horário de exposição ao Sol, sabemos que o nível de radiação
UVB no período anterior às 10 horas da manhã e após as 15 horas (desconsiderando-se
o horário de verão) é mínimo, não justificando a exposição solar durante esses
períodos, particularmente com a intenção de produção de vitamina D
4 – Exposição ao Sol e Desenvolvimento do Câncer de Pele
A incidência do Câncer de pele Não melanoma e Melanoma tem crescido em todo
o mundo há décadas, sendo o mais frequente entre os canceres do corpo humano.
Já está muito bem estabelecido na literatura, e não seria motivo deste texto
discorrer sobre o assunto, a relação de nexo causal entre a exposição solar e o
desenvolvimento do Carcinoma Espinocelular. Além disso, diferentes estudos
também apontam a participação da radiação solar também no desenvolvimento do
Carcinoma Basocelular e do Melanoma Cutâneo
4 – Proteção Solar e Vitamina D
Sabemos que o uso adequado de fotoprotetores reduz de forma siginifcativa a
quantidade de radiação UVB que atinge a superfície cutânea, podendo, desta
maneira, interferir teoricamente na produção de Vitamina D.
Entretanto, na prática sabemos que o uso regular de fotoprotetores não levam
à deficiência de vitamina D.
A possível justificativa encontrada seria a de que, pelo fato dos usuários
não aplicarem o protetor solar na quantidade adequada e com a frequência e
regularidade recomendadas, uma quantidade suficiente de radiação UVB atingiria
a superfície da pele para a produção de Vitamina D. Assim, o uso de
fotoprotetores, da forma como é habitualmente utilizado pelos usuários não
poderia ser considerada como um fator predisponente ao desenvolvimento de
deficiência de vitamina D.
Baseado nas premissas acima apresentadas, apresentamos abaixo a posição da
SBD em relação à Vitamina D e à matéria publicada pela Revista Veja. Devemos
ressaltar que essa posição é semelhante à proposta por outras entidades, como a
Academia Americana de Dermatologia:
1 – A Exposição ao Sol, de forma intencional, não deve ser considerada como
fonte para a produção de vitamina D, ou para a prevenção de sua deficiência.
2 – As medidas fotoprotetoras, como uso de roupas e chapéus, óculos escuros
e a não exposição ao sol em horários extremos (10hrs-15hrs), continuam como a
recomendação mais adequada para a prevenção ao câncer de pele e ao
fotoenvelhecimento
2 – O Uso de Protetores Solares com FPS superiores a 30 devem ser
recomendados para todos os pacientes, acima de 6 meses, expostos ao sol. Não se
deve realizar exposição ao Sol sem o uso adequado de protetores solares.
Crianças abaixo de 6 meses não devem se expor diretamente ao Sol e não devem
fazer uso regular de fotoprotetores. Não se recomenda o uso rotineiro de
Protetores Solares com FPS abaixo de 30.
3 – Pacientes considerados como sendo de risco para o desenvolvimento de
deficiência de vitamina D devem ser monitorados através de exames periódicos e
podem utilizar fontes dietéticas ou suplementação vitamínica para a prevenção
de deficiência de vitamina D.
São considerados fatores de risco para o desenvolvimento de
Deficiência de Vitamina ( D:
Lactentes recebendo amamentação exclusiva
Idosos (pele envelhecida produz menos vitamina D)
Indivíduos com baixa exposição ao sol:
Condições climáticas
Uso rigoroso de medidas de fotoproteção
Cobertura da pele por práticas religiosas
Pessoas com fototipos maiores (fototipos V e VI)
Pacientes com síndrome de mal-absorção
Obesos mórbidos
A dose diária recomendada de Vitamina D para a prevenção de deficiência em
indivíduos de risco é a seguinte:
0-12 meses: 400 UI/dia
1 a 70
anos: 600 UI/ dia
> 70 anos: 800 UI / dia
Por fim, a SBD entende que a política para a Prevenção ao Câncer de Pele,
através da Fotoproteção Consciente, é medida prioritária em termos de Saúde
Pública para o Brasil, na área da Dermatologia.
- Ross A.C. et al. The 2011 Report on
Dietary Reference Intakes for Calcium and Vitamin D from the Institute of
Medicine: What Clinicians Need to Know. J Clin Endocrinol Metab,
January 2011, 96(1):53–58
- Binkley N et al. Low Vitamin D Status:
Definition, Prevalence, Consequences, and Correction . Endocrinol
Metab Clin N Am 39 (2010) 287–301
- De Paula Corrêa M, Ceballos
JC. Solar ultraviolet radiation
measurements in one of the most populous cities of the world: aspects
related to skin cancer cases and vitamin D availability. Photochem
Photobiol. 2010 Mar-Apr;86(2):438-44
Ass:
Sérgio Schalka
Coordenador do Depto de Fotobiologia
Gabriel Gontijo
Vice-Presidente da SBD
Denise Steiner
Presidente da SBD
Notícia publicada em: 15/1/2013